quinta-feira, 29 de julho de 2010
Grávida
Não sou mãe, mas já estive grávida.
Engravidei de esperança quando rezei com toda a minha fé.
Teci sapatinhos com linhas de sonhos para trilhar o meu caminho quando escolhi minha profissão.
Preparei o berço para aconchegar os amigos que ia encontrar.
Chorei de medo do que estava por vir.
Amei tanto que parecia não caber em mim.
Imaginei o futuro com todos os seus detalhes e cores, em plena harmonia, em perfeição.
Embalei desejos, cantei canções de ninar.
Gravidez de vida não acaba, renova-se.
E nesta espera não há homem ou mulher, estamos todos grávidos, bordando toalhinhas em ponto de esperança, concebendo dia-a-dia o nosso futuro.
quarta-feira, 21 de julho de 2010
Calo
Dor de amor não vivido é pior que calo.
Pois calo só dói no sapato apertado.
Não consegue ver, coração, que eu estou usando chinelo?
Pois calo só dói no sapato apertado.
Não consegue ver, coração, que eu estou usando chinelo?
segunda-feira, 12 de julho de 2010
História em frases curtas
Ela andava cansada da mesmice, da mesma cara refletindo no espelho, dos mesmos sonhos escritos no diário, das mesmas frustrações nas mesas de bar com os amigos.
Resolveu fazer então uma loucura. Colocou a roupa mais bonita, o sapato mais alto, o perfume mais caro, passou batom vermelho e saiu de casa sorrindo. Percorreu um caminho diferente do habitual, faltou ao trabalho, comprou uma lingerie provocante. Tomou um sorvete calórico como há muito tempo não fazia e sorriu para um estranho. Sentou na praça e leu Leminski. Não atendeu ao telefone.
Voltou para casa apaixonada. Descobriu que a melhor companhia era ela mesma. Que cada detalhe formaria o todo. E que o todo era um amontoado de frações.
Passou a viver a vida assim: em frases curtas. Pequenas orações do dia-a-dia. Orações sem fé, porém profundas. Talvez profanas.
Resolveu fazer então uma loucura. Colocou a roupa mais bonita, o sapato mais alto, o perfume mais caro, passou batom vermelho e saiu de casa sorrindo. Percorreu um caminho diferente do habitual, faltou ao trabalho, comprou uma lingerie provocante. Tomou um sorvete calórico como há muito tempo não fazia e sorriu para um estranho. Sentou na praça e leu Leminski. Não atendeu ao telefone.
Voltou para casa apaixonada. Descobriu que a melhor companhia era ela mesma. Que cada detalhe formaria o todo. E que o todo era um amontoado de frações.
Passou a viver a vida assim: em frases curtas. Pequenas orações do dia-a-dia. Orações sem fé, porém profundas. Talvez profanas.
sábado, 3 de julho de 2010
Um faraó em meus braços
O dia estava planejado, daria tempo de fazer tudo e talvez até tirar uma soneca no intervalo. Eu precisava tirar fotos de uma exposição sobre o Egito que está acontecendo na Casa da Cultura. A matéria estava pronta, tudo deveria ser simples. A ideia era fotografar a montagem dos ambientes pelos organizadores, uma vez que o foco era na abertura da exposição. Porém, cheguei lá meia hora depois do combinado e as peças ainda não estavam na cidade. O carro estragou, o motorista se perdeu e tudo fugiu do planejado.
Aproveitei para verificar outra pauta no mesmo lugar e conversar um pouco com quem estava por lá. Até que quando eu estava desistindo, as peças chegaram. Todos desceram a escada do enorme e centenário casarão de madeira para matar a curiosidade. Tudo estava embalado em plástico bolha, porém, a visão da múmia era ainda pior que na foto. Deveria ter cerca de 1,70m de altura. Magra como só uma múmia sabe ser. Um cadáver milenar, enfim.
Então, começaram a descarregar. Eu queria logo desembrulhar aquilo tudo, fazer algumas fotos e conseguir chegar à academia no horário marcado, ao contrário do que eu sempre faço. Ainda não tinha almoçado e meu café da manhã foi um iogurte. Planejava passar no mercado, comprar um lanche e mandar as fotos. Mas já eram 14h30. Todos foram pegando as caixas e pacotes. Eu também estava disposta a ajudar, embora sem muita segurança, pois quem me conhece sabe o quanto sou atrapalhada e a minha capacidade incrível de cair.
Estava olhando para uma caixa lá no fundo, com pacotes pequenos. Achei que ela seria ideal para eu carregar, pois corriam menos risco de quebrar no caso de uma queda. Mas é claro que o universo conspirou contra a minha vontade. Já estou começando a aprender a desejar o contrário do que quero, quem sabe comece a dar certo. Todos já haviam subido com suas respectivas caixas e a Kombi ainda estava cheia delas. Porém, o motorista olhou para mim e percebeu a rainha à sua frente. Deve ter visto a própria Nefertari, a primeira esposa do harém do faraó Ramsés II, e o estendeu para mim.
O homem estava com pressa e com cara de quem não aceitaria discussão. Tentei argumentar que era pesado. “Pegue aí pra você ver como agüenta”, ele respondeu. “Ai meu Deus, que medo de carregar um negócio desse. E se eu quebro?”, lamentei. “Quebra nada, mas tenha cuidado”, ordenou.
Andei rezando, com medo de bater em qualquer coisa e fazer a múmia virar pó, como qualquer mortal. Quando cheguei à escada, alguém ia descer. “Hey! Espere aí que eu vou passar com o faraó”, disse eu.
Nem pude acreditar quando soltei a múmia no chão, inteira. Ele foi o maior governante do Egito, ficando por 70 anos no poder. Tentando disfarçar o meu horror, fui desembrulhando o bonitão para poder fazer a foto.
Quando contei ao meu pai e mostrei a foto do gatinho que carreguei nos braços ele disse: “Ui ui! Melhor virar pó do que ficar assim, com os outros carregando”. Acabou com meu ego, nem meu pai achou que o faraó se sentiria honrado em ser carregado por mim, a princesa Carolina do reinado inexistente.
Uma amiga minha já foi mais sensível: “Poderosa, hein!”, disse aos risos. “Credo, que horror! Não ficou com medo?”, falou outra. “Não cheira mal?”, perguntou alguém. Ele não cheirava mal, cheirava a museu, sabe? Aquele perfume que me causa uma reação (alérgica, é claro!).
Lembrar do cabelo ainda me dá coceira. E a expressão que devo ter feito certamente foi hilária.
Só posso terminar dizendo que nem todo mundo pode dizer que teve um faraó em seus braços! Ela era uma réplica, é claro. Mas se eu não contasse você nem desconfiaria, né?
Aproveitei para verificar outra pauta no mesmo lugar e conversar um pouco com quem estava por lá. Até que quando eu estava desistindo, as peças chegaram. Todos desceram a escada do enorme e centenário casarão de madeira para matar a curiosidade. Tudo estava embalado em plástico bolha, porém, a visão da múmia era ainda pior que na foto. Deveria ter cerca de 1,70m de altura. Magra como só uma múmia sabe ser. Um cadáver milenar, enfim.
Então, começaram a descarregar. Eu queria logo desembrulhar aquilo tudo, fazer algumas fotos e conseguir chegar à academia no horário marcado, ao contrário do que eu sempre faço. Ainda não tinha almoçado e meu café da manhã foi um iogurte. Planejava passar no mercado, comprar um lanche e mandar as fotos. Mas já eram 14h30. Todos foram pegando as caixas e pacotes. Eu também estava disposta a ajudar, embora sem muita segurança, pois quem me conhece sabe o quanto sou atrapalhada e a minha capacidade incrível de cair.
Estava olhando para uma caixa lá no fundo, com pacotes pequenos. Achei que ela seria ideal para eu carregar, pois corriam menos risco de quebrar no caso de uma queda. Mas é claro que o universo conspirou contra a minha vontade. Já estou começando a aprender a desejar o contrário do que quero, quem sabe comece a dar certo. Todos já haviam subido com suas respectivas caixas e a Kombi ainda estava cheia delas. Porém, o motorista olhou para mim e percebeu a rainha à sua frente. Deve ter visto a própria Nefertari, a primeira esposa do harém do faraó Ramsés II, e o estendeu para mim.
O homem estava com pressa e com cara de quem não aceitaria discussão. Tentei argumentar que era pesado. “Pegue aí pra você ver como agüenta”, ele respondeu. “Ai meu Deus, que medo de carregar um negócio desse. E se eu quebro?”, lamentei. “Quebra nada, mas tenha cuidado”, ordenou.
Andei rezando, com medo de bater em qualquer coisa e fazer a múmia virar pó, como qualquer mortal. Quando cheguei à escada, alguém ia descer. “Hey! Espere aí que eu vou passar com o faraó”, disse eu.
Nem pude acreditar quando soltei a múmia no chão, inteira. Ele foi o maior governante do Egito, ficando por 70 anos no poder. Tentando disfarçar o meu horror, fui desembrulhando o bonitão para poder fazer a foto.
Quando contei ao meu pai e mostrei a foto do gatinho que carreguei nos braços ele disse: “Ui ui! Melhor virar pó do que ficar assim, com os outros carregando”. Acabou com meu ego, nem meu pai achou que o faraó se sentiria honrado em ser carregado por mim, a princesa Carolina do reinado inexistente.
Uma amiga minha já foi mais sensível: “Poderosa, hein!”, disse aos risos. “Credo, que horror! Não ficou com medo?”, falou outra. “Não cheira mal?”, perguntou alguém. Ele não cheirava mal, cheirava a museu, sabe? Aquele perfume que me causa uma reação (alérgica, é claro!).
Lembrar do cabelo ainda me dá coceira. E a expressão que devo ter feito certamente foi hilária.
Só posso terminar dizendo que nem todo mundo pode dizer que teve um faraó em seus braços! Ela era uma réplica, é claro. Mas se eu não contasse você nem desconfiaria, né?
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