sexta-feira, 11 de junho de 2010

Meu jeito de dizer que te amo*



Meu amor está em poemas ainda não escritos, em versos escondidos de mim mesma, em sonhos que ainda não viraram realidade.
Procuro ser gentil, sorrir e alegrar, afinal, não sei quem te conhece e quero que sempre ouça coisas boas sobre mim. Não o amo em cenários de pôr-do-sol. Eu o amo no dia a dia, na meia rasgada, na olheira, no cabelo oleoso. Faz parte de mim o verbo amar. Eu o amo quando quero ficar bonita. Eu o amo quando acordo e faço tudo o que programei, sempre esperando que algo me surpreenda e mude o rumo do meu dia. Eu o amo quando penso em seus defeitos e em tudo aquilo que eu jurava nunca suportar. Eu o amo quando cultivo o bom humor.
Eu o amo quando penso no presente que vou lhe dar. Eu o amo quando ouço uma música que me faz pensar em nosso amor. Eu o amo quando leio poesia. Eu o amo como ama a princesa ao seu príncipe, feliz para sempre, até que se feche o livro. Eu o amo quando suspiro nos filmes de finais felizes e quando sinto vontade de chorar se a mocinha não se dá tão bem assim.
Eu o amo quando choro de saudades de tudo aquilo que não vivi. Eu o amo quando reconheço que aquele que veio antes não era amor.
Eu o amo ainda sem o conhecer. Sorrio ao caminhar. Canto, pareço feliz. Afinal, até que chegue o momento, nunca saberemos - eu e ele - onde vamos nos encontrar. Por isso, é preciso estar preparada, perfumada, sorridente. Eu o amo com a alegria de quem já conhece o amor por ter certeza de que um dia ele será real.
Eu o amo no presente, embora ainda sejamos futuro.
Feliz dia dos namorados!

* Mais uma postagem coletiva para o Espaço Aberto.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Lá no céu tem telefone?

Minha dentista era gente finíssima, contrariando o seu físico de gordinha, alta, com uma gargalhada que compete com a minha. A assistente só não era alta, no restante eram iguais. Uma loira, outra morena. Eu, paciente, sofria por não poder falar o tempo todo enquanto ela me tratava. Ir ao consultório era sempre divertido, apesar do barulho estressante do motor e da anestesia. Três gordas bem humoradas numa sala era fato que deixava os pacientes que aguardavam curiosos para saberem o motivo das risadas.

Eu conhecia a Maria desde criança. Aproximadamente 10 anos mais velha do que eu, sempre ouvia falar que ela estava estudando fora. A encontrava na rua durante as férias ou finais de semana, sempre simpática. Eu adorava o cachorro que ela tinha, um dálmata. O único que eu tinha visto até o lançamento do filme da Disney.

Volta e meia antes da consulta, ela ou a Joana, a assistente, ligava para saber se eu iria. Uma vez cheguei a chorar de vontade de rir quando eu estava sem poder falar e a Joana soltou essa: “Onde você compra calcinha, Carol? Porque outro dia eu fui comprar lingerie. A vendedora me apareceu com umas ‘carçolas de veia’. Pior é que tinha uma vermelha! Aaaaaii que raiva que me deu! De certo ela pensou que se eu levasse um fio dental tinha que atravessar a rua e comprar também um pé-de-cabra pro meu marido conseguir tirar a calcinha de lá...”. Quando consegui me controlar ela complementou: “Eu nem queria fio dental. Mas bandeira do Mengão o Zé já tem”.

Às vezes, no meio da consulta o celular dela tocava. Se era um avião decolando era o maridão ligando para dar um oi. “Quando é você posso atender”, dizia rindo. Então pedia para ele ligar mais tarde porque estava atendendo uma paciente importante. “Já carreguei ela no colo, acredita?. Eu estou ficando velha”, contava.

Eu sabia que ela estava doente. Não parecia nem comentava. Quinze dias antes fui até lá para buscar uma placa de silicone que havia encomendado e como o paciente faltou, sentei e rimos o tempo de uma consulta. Não lembro quem ligou naquela noite, só lembro da vontade de chorar. De manhã fui ao velório. “A gente sabia que era grave, mas esperava que fosse aí mais uns 10 anos, sei lá”, disse o pai dela inconformado para nós. Chorei.

Sou medrosa, mas pela primeira vez na vida não tive medo de sentar perto do caixão. Ela era minha amiga e não havia lugar mais longe. Fiquei bem na altura das suas mãos. Elas estavam inchadas, enormes como eu nunca havia visto. Fiquei olhando as pessoas que chegavam perto, as que choravam, as que rezavam, as que faziam carinho. Viajando nos pensamentos sobre a brevidade da vida, eu lembrava das suas gargalhadas. Ela parecia sorrir, deixando um resquício de vida àquela palidez. Soube, ouvindo as conversas alheias, que dias depois do nosso último encontro ela foi para o hospital. Fiquei triste por não saber.

Então, no bolso do meu casaco vermelho o celular vibrou. Era um modelo de flip. Eu estava desempregada, então achei melhor ver quem estava ligando antes de desligar. Neste momento eu tenho certeza que ouvi a gargalhada inconfundível. No identificador apareceu: “Maria dentista chamando”.

Olhei para ela, olhei para o aparelho. Olhei para ela, olhei para o aparelho. Repeti o gesto mais três vezes, pelo menos. Nas mãos dela um terço, nenhum movimento. Saí de lá com os olhos arregalados - só minha mãe que estava perto sabe dizer o tamanho do susto. Atendi: “Oi Carol, é a Joana. Queria te...”. “Oi Jo, eu sei! Já estou aqui. Obrigada por ligar”. “Ai que bom, ela te queria tão bem”.

Voltei e não pude deixar de rir. “Meu celular nunca toca e quando toca é o morto me chamando para o próprio velório... Só você, né?”, pensei.

Sei lá se no céu tem internet, banda larga, se lê blog ou pensamento. Só tenho certeza que está rindo. Deve ter combinado tudo com a Joana pra garantir uma piada pra contar a São Pedro.