Quarentar se fez verbo. Quarentar é ter a sensação de estar no meio do caminho. É estar tão perto dos 20 quanto dos 60. É assustador não ser tão jovem que possa rir das irresponsabilidades nem tão velha para me aposentar.
As escolas
nas quais estudei não existem mais. São prédios antigos, vazios, que não ecoam
mais os gritos e risadas da infância e da juventude, mas guardam segredos
cochichados entre melhores amigos e quiçá algum desenho não encoberto pela
tinta que apaga os riscos, mas não as memórias. As lembranças são tão nítidas
que posso narrar em detalhes as salas de aula, a poeira brilhando magicamente
sob o sol da manhã de inverno e o cheiro do tempero do lanche sendo preparado
na cantina. Depois da escola, era a hora da bicicleta, da piscina, dos jogos de
queimada na rua, debaixo da árvore de folhas gigantes.
Ainda
guardo comigo a manta vermelha na qual eu era carregada quando bêbe, como se a
infância estivesse logo ali, como se eu ainda coubesse no colo de minha mãe e
pudesse ser ninada até o choro cessar.
É setembro.
Já se pode sentir o cheiro da primavera dobrando a esquina. Os ipês floresceram
lindamente neste ano, mesmo longe de mim. A natureza é imperiosa e não se
abstém de sua função. Os ipês são belos, não importa a perspectiva da qual
sejam admirados: olhando para cima, pintam de amarelo o céu azul, para baixo,
dão vida à calçada, transformando-a em tapete sem igual. Em um momento em que a
vida me faz perguntas cruciais, os ipês amarelos me aguardam dizendo que eu
posso sempre voltar, que a vida é bonita e que os ciclos vêm e vão: é preciso
brotar, ser semente, florir, alegrar, cair e recomeçar.
Quarentei
com medo de dizer que quarentei. Quatro décadas parecem muito para quem acha
que viveu tão pouco e aprendeu quase nada. Que eu possa cinquentar, sessentar,
setentar, oitentar e até mesmo noventar, como fizeram minha avó e tias-avós,
pois, enquanto for verbo, serei vida.